Daniel e Abedi

A história de uma amizade que conduziu Daniel e Abedi à fé católica.

Daniel

Nasci em Kisangani, uma das grandes cidades da República Democrática do Congo. Era anteriormente conhecida como Stanleyville. Nessa época, Stanley tinha subido o rio Congo desde Kinshasa, 1700 quilómetros navegáveis, até este lugar onde fundou um porto comercial.

Não longe de Kisangani encontra-se a catarata de Wagenia. Trata-se da última das sete cataratas que se estende ao longo de 100 km acima de Kisangani. É aqui que os famosos pescadores Wagenia arriscam as suas vidas instalando armadilhas fabricadas à mão para apanhar os peixes a meio dos rápidos do rio. Eles também são conhecidos como pescadores acrobatas, que utilizam uma técnica de pesca única no mundo.

Mas eu não sou nem acrobata nem pescador, mas estudante na Politécnica. Sem saber nadar, mergulhei nas fórmulas matemáticas, que são mais certas, pois podemos prever tudo. No entanto, a história que vou contar superou qualquer previsão. Com efeito, só tenho uma palavra para descrever tudo aquilo que me aconteceu: Providência.

Daniel, à chegada a Kinshasa.

Tudo começou em 2017, quando aterrei em Kinshasa para começar os meus estudos na Universidade. Pouco tempo depois da minha chegada, através de um amigo, conheci o Abedi, que gostava muito de trabalhar como eu. Ele vinha de Kolwezi, uma cidade mineira no sul do país. Posso chamar o Abedi a minha alma gémea. Apesar das distâncias que nos separavam, as nossas vidas são marcadas por várias coincidências. Mas vamos molo molo (pouco a pouco), como se diz em lingala.

O ano preparatório na Politécnica é particularmente exigente. Depois de o ter concluído, infelizmente o Abedi e eu não passámos. Decidimos então mudar de Faculdade, só que, nessa época, reinava uma grande desordem na Universidade, pelo que existiam grandes desfasamentos, para o início do ano académico, entre uma Faculdade e outra. Foi assim que decidi continuar retomando o ano como externo, enquanto o Abedi quis esperar alguns meses para começar os estudos em Química. Nesse momento, separámo-nos, sem nos voltarmos a ver muito depois. Mas passo a palavra ao Abedi para continuar a história.

Abedi

O Daniel já me apresentou. Eu só acrescento que sou o terceiro filho mais novo de uma família de dez. Tal como o Daniel, desde a minha mais tenra infância, cresci nas igrejas do Despertar, comunidades pentecostais com origem no protestantismo. Lembro-me que, durante o meu último ano na escola, decidi dar mais importância à fé e comecei a participar cada domingo no culto.

Abedi numa excursão ao rio Congo.

Existiam na minha vida duas coisas importantes, o trabalho e Deus. Mas devo dizer que não conseguia conciliá-los. Alguma coisa no meu coração me dizia que rezar e trabalhar deviam poder conciliar-se, que Deus devia estar presente durante todo o meu dia. Eu lia muito a Bíblia, no entanto, sentia uma grande inquietação e um grande vazio interior. Embora rezasse, não conseguia encontrar aquela conciliação ao frequentar as igrejas do Despertar. Era como se fossem dois mundos separados: a oração e tudo o resto.

Quando comecei os meus estudos em Química, um amigo de Kolwezi telefonou-me para me dizer que vinha para Kinshasa, e que podíamos ficar juntos num estúdio. Comecei então a procurar o estúdio, encontrei-o e paguei o sinal. Pouco depois, o meu amigo telefonou-me para me dizer que afinal já não vinha. Isso deixou-me numa situação complicada, porque eu tinha usado praticamente todo o meu saldo para pagar o sinal de arrendamento do estúdio e fiquei sem dinheiro. Rapidamente comecei a procurar alguém que estivesse interessado em partilhar o estúdio comigo de forma a assumirmos juntos o custo da renda.

Estava nesta situação quando ao entrar com os amigos da Faculdade – sei que é um pouco estranho – me passou pela cabeça ir à casa de banho, apesar de não ter realmente grande necessidade. Pedi para esperarem por mim, apesar de perceber que eles estavam um pouco aborrecidos. Fui ao sítio mais próximo. Ao passar, com grande surpresa, vi o Daniel, sentado debaixo de uma árvore, a comer qualquer coisa. Já não nos víamos há muito tempo. Depois de trocarmos algumas novidades, disse-me que estava à procura de um sítio para morar. Mais tarde contou-me que, por seu lado, estava a rezar a Deus para poder encontrar um colega de quarto, bom estudante, aplicado no trabalho tal como ele! Começámos então a partilhar o mesmo estúdio.

A inquietação por conciliar Deus e o trabalho não me tinha deixado. Um dia, eu conversava com amigos que, de repente, começaram a criticar um centro do Opus Dei (Centre Culturel Loango), afirmando que lá se diziam coisas estranhas, tais como santificação do trabalho ou que o trabalho é oração. Para ser sincero, isso interessou-me logo, apesar de eles falarem tão mal disso.

Liguei-me à Internet e procurei Opus Dei. Desde então, subscrevi o canal YouTube. Comecei a ver os vídeos, e vi que não havia nada de mal, ao contrário do que pretendiam as afirmações críticas desses amigos. Eu queria ir lá, mas não tinha a coragem de dizer a esses amigos que diziam tanto mal para me levarem. Pouco tempo depois, encontrei o Fidel que já frequentava o Centro, e pedi-lhe para ir com ele.

Da primeira vez que entrei no Centro, experimentei uma grande paz interior. Percebi logo que encontraria lá uma resposta à minha inquietação de conciliar Deus e o trabalho. Quando os amigos souberam que eu tinha ido ao Centro, começaram a criticar-me, e alguns até me abandonaram literalmente. Com esta experiência, quando cheguei a casa, escondi a brochura de apresentação do Centro bem no fundo da minha mala, pois não sabia o que ia pensar o Daniel, e não tinha vontade de discutir com ele.

Qual não foi a minha surpresa, quando um dia, o Daniel me disse: Abedi, vou ao Centro. Que Centro?, perguntei-lhe. O Centre Culturel Loango, respondeu-me. Foi então que eu descobri que o Daniel também frequentava o Centro há alguns meses. Com efeito, ambos frequentávamos o Centro sem nunca nos termos cruzado. É realmente engraçado. Ele também tinha a sua brochura, mas bem arrumada por debaixo dos seus apontamentos. Não me tinha convidado porque sabia que eu não era católico, e não me queria ofender.

Pouco tempo depois, decidi conhecer melhor a fé católica. Foi assim que Dominique começou a explicar-me os elementos de base da doutrina cristã, e depois, um pouco mais tarde, juntei-me à catequese sobre os sacramentos, que Costa já dava a um outro estudante. Foi grande a minha surpresa, quando no dia combinado, encontrei o Daniel na sessão de catequese!

Tínhamos ido evoluindo, e um dia eu disse ao Daniel que tinha decidido batizar-me. Para minha grande alegria, ele também pensava fazer o mesmo. Foi assim que recebemos juntos os sacramentos de iniciação cristã no Centre Culturel Loango.

Devo dizer que aquilo que me chamou mais a atenção no espírito do Opus Dei foi a unidade de vida, a possibilidade de conciliar Deus e o trabalho, Deus e os amigos, Deus e o desporto, etc. Estou literalmente apaixonado pelo espírito do Opus Dei, que tento viver nas minhas circunstâncias.

Daniel

Fala novamente o Daniel. Disse-vos que o Abedi é de certa forma a minha alma gémea. A sua história é muito semelhante à minha. Lembro-me que quando estava no fim da primária, tínhamos missa obrigatória na escola todas as quartas-feiras, às 5h30m. Sendo protestante, foi na Missa que percebi que tudo na fé católica tinha um sentido. Eu gostava da ordem da Missa e pensei que ela era sem dúvida um presente a Deus, e que era por isso que se cuidavam todos os pequenos detalhes. Tudo isto estava no fundo do meu coração, era, à semelhança do Abedi, uma inquietação por conciliar Deus com todas as atividades da vida. É por isso que eu vejo o Centre Culturel Loango como um verdadeiro presente de Deus para mim.

Receberam os sacramentos do Batismo e Crisma em Loango.

Contudo, durante a adolescência, esta inquietação tinha desaparecido um pouco. Eu tinha deixado de ir ao culto protestante e tinha acabado por acreditar que a razão era incompatível com a fé. Devo à minha avó, católica, ter saído deste erro. Ela disse-me um dia : “Kijana wa akili sa weye, anapasha kumpenda Mungu, na kama alama ya zamiri unapashwa kuwa mfwasi mwema wa Kristu”, “um rapaz inteligente como tu devia necessariamente amar Deus e como sinal de reconhecimento, tu devias ser um bom discípulo de Cristo”. Eu tinha esquecido isso, mas ao frequentar o Centro lembrei-me. No Centro, aprendi a conciliar o trabalho e Deus, a razão e a fé, recebi uma formação completa. A minha avó ficou muito feliz por saber que eu agora sou católico.